De alta qualidade e com a vantagem de chegar mais fresco do que muitos importados à mesa do consumidor, o azeite nacional costuma ser disputado. Tanto que, apesar do preço mais elevado, uma parcela desses rótulos é comercializada antes de ser engarrafada.
Para ajudar o consumidor a descobrir essa produção, a Folha de São Paulo organizou um painel com azeites de marcas nacionais reconhecidas cuja safra acaba de chegar ao mercado.
A degustação foi feita às escuras, e reuniu inicialmente uma amostra de 20 rótulos extravirgens diferentes de dez produtores — apenas o melhor exemplar de cada um deles foi considerado. Tanto azeites monovarietais (aqueles feitos com uma qualidade de azeitona) quanto blends fizeram parte da seleção. As amostras foram enviadas, a pedido da reportagem, pelos produtores.
Participaram da avaliação a especialista Ana Beloto, consultora na área, Patrícia Galasini, presidente da Câmara Setorial de Olivicultura do Estado de São Paulo, e Sandro Marques, autor de “Extrafresco: Guia de Azeites Brasileiros”, que tem edição bianual e cobre toda a produção do país.
“Foi uma amostra bem significativa da produção nacional”, afirma Marques. “É bom constatar que seguimos crescendo em qualidade. Estamos aprendendo, por exemplo, a fazer blends cada vez melhores”, continua ele.
Neste ano, as duas principais regiões produtoras, a Serra da Mantiqueira (neste caso, a divisa de São Paulo e Minas Gerais) e o Rio Grande do Sul, tiveram resultados opostos em suas colheitas devido às condições climáticas.
No Sudeste do país, segundo o presidente da Assoolive (Associação dos Olivicultores dos Contrafortes da Mantiqueira), Moacir Nascimento, a produção caiu cerca de 50% em relação ao ano anterior.
Foi o que aconteceu com a fazenda onde é produzido o azeite Sabiá, em Santo Antônio do Pinhal, em São Paulo. Em agosto passado, as oliveiras da propriedade de Bia Pereira e Bob Vieira da Costa estavam cheias de brotos. “Achei que seria a melhor colheita da história”, conta Bia.
Em setembro, no entanto, começou a chover muito forte todos os dias. Boa parte das flores caiu e, com isso, vieram poucos frutos. O resultado foi uma produção que não chegou a um terço daquela obtida um ano antes.
Por outro lado, na outra fazenda do casal, em Encruzilhada da Serra, no Rio Grande do Sul, a seca (que devastou outras culturas na região) garantiu colheita fantástica de azeitonas: o dobro da de 2022.
No Sul do Brasil, de acordo com Renato Fernandes, presidente do Ibraoliva (Instituto Brasileiro de Olivicultura), a colheita de azeitonas de 2023 deve garantir uma produção de azeites no mínimo 10% superior à produção de 2022 —que foi o dobro da de 2021.
Bons azeites extravirgens não se fazem sozinhos. “É preciso, por exemplo, colher no ponto de maturação ideal para dar ao mesmo tempo rentabilidade e características sensoriais desejadas”, diz Ana Beloto, autora do livro “Azeite-se” (ed. Rona; 288 págs.).
No lagar, onde o azeite é produzido, é a mesma coisa. “Precisamos buscar uma regulagem das máquinas que garanta o resultado desejado. Se a temperatura, por exemplo, estiver muito fria, se extrai pouco azeite. Muito quente, altera as características sensoriais.”
Como esse consumo ainda é de nicho no Brasil, que produz, de forma geral, azeite extravirgem premium, muitos consumidores ainda têm dúvida sobre como dar os primeiros passos nesse universo. “Cada pessoa tem um paladar”, diz Patrícia Galasini, também professora do Senac-Aclimação. “Mais comum é preferir os ‘doces’ de início. Então, sugiro começar com esses produtos de perfil mais suave e caminhar para os mais picantes e amargos. O paladar é uma construção.”
Confira a seguir a lista dos azeites mais bem avaliados durante a degustação:
Vertentes Novas Vertentes
Blend das variedades coratina, arbequina, grappolo, koroneiki e arbosana, de Andrelândia (MG). Suave e complexo ao mesmo tempo, tem frutado maduro que lembra maçã, banana e goiaba branca. Pede um prato delicado a exemplo de um risoto de ervilha ou doces como cheesecake.
Vienzo Koroneiki
Instalada no município de Rancho Queimado, A Quinta do Vienzo é pioneira na produção de azeites em Santa Catarina. Este exemplar da variedade koroneiki se destaca pelas notas de maçã, banana e flores. “Deve ficar bom com comida árabe, que pede algo um pouco mais ‘doce’”, diz Sandro Marques.
Estância das Oliveiras Frantoio
Chama a atenção no azeite, produzido em Viamão, a 28 km de Porto Alegre, o aroma de grama recém-cortada. Aparecem ainda rúcula, agrião e alcachofra. “Tem equilíbrio entre amargor e picância”, diz Ana Beloto. Combina com folhas escuras e feijão-branco.
Milonga Arbequina Retrato
Tem aromas herbáceos que remetem a talo de couve e grama cortada. “É um exemplo do que é chamado de frutado verde nos azeites”, diz Patrícia. Equilibrado, tem picância e amargor médios. “Comeria com feijão, farofa e couve refogada.” Feito em Triunfo, a cerca de 80 km de Porto Alegre.
Bem-Te-Vi Arbequina e Arbosana
De Encruzilhada do Sul (RS), remete a ervas, como tomilho, manjericão e orégano. “Aqui eu usaria a regra do menos é mais, comeria com uma massa e molho vermelho apenas”, afirma Ana Beloto.
Casa Marchio Koroneiki
Ideal para quem gosta de sabores mais amargos. No nariz, traz folhas escuras como rúcula e agrião. “Fica bom sobre uma carne grelhada”, diz Sandro Marques.
Sabiá Blend de Terroir
Blend que combina as variedades coratina, koroneiki e arbosana, das duas fazendas da marca (Sul e Mantiqueira). Complexo, intenso e equilibrado, tem especiarias e aromas florais. Harmoniza com peixes e frutos-do-mar.
Irarema Intenso
Feito com as azeitonas koroneiki e grappolo em São Sebastião da Grama, divisa de São Paulo e Minas, tem “aromas de folhas verdes”, diz Patrícia Galasini. Versátil, funciona de saladas a escabeches.
Orfeu Blend da Safra
Supreendeu por estar bastante maduro. Blend de koroneiki, arbequina, grappolo, coratina e picual agrada quem está iniciando no mundo dos azeites especiais.
Fonte: Folha de São Paulo