A criação do plástico e o desenvolvimento de sua produção no início do século 20 revolucionou diversas áreas, da medicina à moda, da indústria bélica à comunicação, além de mudar hábitos de consumo. No século 21, porém, o descarte do material virou um problema ambiental grave. Leve, econômico, resistente e adaptável. Mas de difícil decomposição. Conheça a história do plástico, como ele transformou a vida moderna e quais os esforços de organismos internacionais, ONGs, ativistas, membros da sociedade civil e governos para que ele deixe de ser uma ameaça para a natureza e para a própria humanidade.

O que é plástico?
Plástico é um material sintético criado a partir do rearranjo das moléculas do petróleo bruto. Trata-se de um polímero, formado por longas cadeias repetitivas de moléculas. É devido a essa origem química que muitos tipos de plástico têm “poli” no início de seus nomes. Existem vários tipos diferentes de plástico. Eles são, majoritariamente, divididos entre duas categorias: os termoplásticos e os termorrígidos.

– termoplásticos são aqueles que podem amolecer e até derreter quando aquecidos, e endurecer quando resfriados – tudo isso de forma reversível
– termorrígidos são os plásticos que se alteram quimicamente quando aquecidos e não podem ser remodelados (o que reduz as possibilidades de serem reciclados)

Como o plástico ameaça o mundo?
As enormes quantidades de plástico produzidas no mundo, a dependência da população em relação a esse material, sua baixíssima taxa de decomposição (que, a depender do material, pode chegar a 600 anos) e a incapacidade de lidar suficiente e ecologicamente com esses materiais têm alarmado organismos internacionais, ONGs, ativistas, membros da sociedade civil e governos. Tempo estimado de decomposição de diferentes materiais plásticos saco plástico: 20 anos copo de espuma plástica: 50 anos canudo: 200 anos garrafa plástica: 450 anos fralda descartável: 450 anos linha de pescar: 600 anos A conscientização de diferentes setores se dá principalmente a respeito do impacto do plástico na vida marinha – os oceanos são o principal fim de resíduos plásticos que não têm destinação adequada. De acordo com um estudo publicado em setembro de 2015 na revista Pnas, cerca de 90% dos pássaros marinhos ingeriram plástico durante suas vidas. Em 2016, uma sacola plástica foi encontrada na Fossa das Marianas, o local mais profundo dos oceanos, localizado no Pacífico.

10 milhões de toneladas é a quantidade aproximada de plástico que chega aos oceanos todos os anos, de acordo com um relatório divulgado em março de 2019 pelo WWF Para efeito de comparação, esse número representa 23 mil aviões Boeing 747 pousando nos mares e oceanos todos os anos – ou seja, seriam mais de 60 aviões por dia. A publicação de estudos como o mais recente da WWF é um mecanismo de pressão para que países lidem com plásticos de forma mais consciente.

Os impactos na saúde humana
No caso de seres humanos, ainda não há evidências de possíveis malefícios decorrentes dos microplásticos. Mas o meio científico tem observado essas partículas em específico, pois são elas, além dos nanoplásticos (ainda menores, com menos de 100 nanômetros de diâmetro), que podem ser ingeridas por seres humanos. E isso pode ocorrer de várias formas: a partir da água; do consumo de produtos de origem marinha (via cadeia alimentar); a partir da pele, por meio de cosméticos (o que é considerado improvável, mas possível); ou a partir da inalação de partículas pelo ar. A passagem de microplásticos via cadeia alimentar, passando de organismos marinhos menores para peixes maiores, por exemplo, já foi documentada.

No caso de seres humanos, essa passagem pode ser dificultada pelo fato de que microplásticos em peixes tendem a estar em seu trato digestivo – partes que, no geral, não são consumidas. Ainda não há pesquisa suficiente sobre a presença de microplásticos em tecidos de peixes, por exemplo, mas já foi identificada sua presença em frutos do mar, como ostras. Um estudo apresentado em congresso em outubro de 2018, realizado pela Universidade Médica de Viena e pela agência estadual do meio ambiente da Áustria, identificou a presença de microplásticos no intestino humano. Pessoas de países distantes entre si (Reino Unido, Itália, Rússia e Japão) tiveram suas fezes analisadas. Nelas, foram encontradas partículas de PVC, polipropileno, PET, entre outros plásticos. Trata-se ainda de um estudo piloto, mas a distância geográfica dos participantes e os tipos de plástico identificados já foram considerados fatores de alerta para os cientistas, que ressaltaram a urgência de pesquisar os impactos dessas partículas no organismo humano, ainda mais se estiverem acrescidas de aditivos (muitas vezes cancerígenos).

Microplásticos, em baixa proporção, também já foram identificados no sal de cozinha, na água engarrafada e da torneira, em cerveja e no mel. O plástico também pode impactar a saúde humana de forma indireta, a partir de aditivos em sua composição. Um exemplo é o bisfenol A, conhecido como BPA, que está presente em materiais plásticos usados para armazenar alimentos, bebidas e produtos de higiene e é absorvido pelo corpo, de acordo com um estudo feito pela Universidade Politécnica do Estado da Califórnia em 2016.

Alguns estudos sugerem que a substância está associada ao desenvolvimento de obesidade, diabete, infertilidade e alguns tipos de câncer, mas não há consenso no meio científico sobre os efeitos do BPA à saúde. Há, ainda assim, iniciativas para a prevenção do contato com o BPA. É o caso de embalagens “BPA free”, que indicam a ausência da substância ao consumidor, e da proibição do BPA em mamadeiras fabricadas no Brasil pela Anvisa, em 2011.

Por que é preciso usá-lo de forma mais racional
Da década de 1950 até hoje, a produção de plástico superou a de qualquer outro material. E muitos dos plásticos são produzidos com o objetivo de serem utilizados uma só vez e depois descartados. O plástico não é considerado um material biodegradável, pois poucos fungos e bactérias são capazes de digeri-lo. Portanto, a maior parte do resíduo plástico jogado na natureza continua a existir indefinidamente, mesmo que na forma de microplásticos.

De acordo com um estudo divulgado em 2016 durante o Fórum Econômico Mundial, a expectativa é que a quantidade de plástico produzida no mundo ao longo dos anos dobre até 2036. Nesse ritmo, segundo o estudo, os oceanos do planeta terão mais plástico do que peixes, em peso, até 2050. De acordo com um estudo de 2019 feito pelo WWF, se o volume de plástico que chega aos oceanos continuar no mesmo ritmo, até 2030, haverá o equivalente a 26 mil garrafas de plástico no mar a cada km². Mudar a chamada “economia do plástico” não é tarefa fácil, principalmente devido a enorme presença de materiais plásticos, disseminados no cotidiano da população mundial, e também pela dificuldade em encontrar substitutos tão versáteis quanto o plástico e que se mostrem ecologicamente corretos a longo prazo.

Mesmo assim, organismos internacionais têm elaborado recomendações para que governos desenvolvam iniciativas de contenção à poluição dos plásticos. O braço da ONU para o meio ambiente divulgou um relatório em junho de 2018 a respeito de plásticos descartáveis, que via de regra são utilizados uma vez só. Nele, elaborou uma passo a passo para ações governamentais baseado na experiência de 60 países. Identificar os plásticos descartáveis mais problemáticos, a extensão do problema e os impactos da má gestão desses resíduos Considerar as melhores ações para enfrentar o problema Avaliar os potenciais impactos sociais, econômicos e ambientais das ações escolhidas.

Um exemplo de pergunta a ser respondida, segundo a ONU, é: “como os pobres serão afetados?” Identificar e engajar as partes interessadas nessas mudanças – varejistas, consumidores, representantes de setores da indústria, governo local, fabricantes, sociedade civil, ambientalistas, associações para o turismo – para garantir uma ampla adesão Conscientizar as pessoas sobre as consequências do uso indiscriminado de plásticos descartáveis (investimento em comunicação) Promover alternativas antes que proibições ou restrições sejam colocadas, garantindo que haja pré-condições para sua disseminação no mercado.

Exemplos de como governos podem executar esse passo são: incentivos econômicos para a produção de materiais ecologicamente corretos, que não causem mais problemas (há substitutos que podem ser ainda mais poluentes que o plástico, se usados em larga escala); incentivos fiscais; liberação de fundos para pesquisa e desenvolvimento; parcerias público-privadas; suporte a iniciativas relacionadas à reciclagem desses produtos, entre outras Incentivar a indústria a partir da redução de impostos ou outros mecanismos para auxiliar a sua transição.

O relatório reitera que os governos enfrentarão resistência de diversos setores da indústria do plástico e é necessário dar tempo para que se adaptem

Utilizar a receita decorrente de impostos sobre os plásticos descartáveis para maximizar o bem público, dando suporte a projetos ambientais, incrementando a reciclagem local, gerando empregos no setor de reciclagem de plástico, entre outras possibilidades.

Certificar-se que as medidas estão sendo implementadas efetivamente, garantindo que haja a alocação clara de funções e responsabilidades para fazê-las funcionar.

Monitorar e ajustar as medidas, se necessário, e atualize as pessoas sobre como está o andamento e eventuais progressos.

Há outros tipos de recomendações que podem ser feitas ao consumidor.

Por exemplo, a pesquisa exibida no Fórum Econômico Mundial de 2016 reforça a necessidade de se usar mais plásticos reutilizáveis. Segundo ela, o foco deve ser em negócios entre empresas, mas também devem ser considerados os plásticos usados por consumidores, como é o caso das iniciativas de restrição ao uso de sacolas plásticas e canudos.

Outro aspecto ressaltado pela pesquisa é que é necessário investir em pesquisas de diferentes setores, com o objetivo de se criar um protocolo global, com orientações e formatos específicos para que o plástico seja mais bem reaproveitado. Segundo o estudo, o problema da “economia do plástico” é a sua fragmentação. A carência de padrões e coordenações por meio da cadeia de produção viabilizou a proliferação de materiais em formatos que acabam dificultando a reciclagem e o reaproveitamento. Há cada vez mais incentivo também para a conscientização individual e a mudança de hábitos. Um exemplo disso é a adoção de um estilo de vida lixo zero, que tem sido disseminado na internet há poucos anos, no qual o objetivo é produzir o mínimo de lixo possível e, consequentemente, não utilizar plásticos descartáveis.

Fonte: Nexo / Foto: Reprodução Internet