A inteligência artificial é uma grande preocupação no congresso há nove meses das eleições municipais de 2024. Atualmente, 89 projetos de lei (PL) sobre a temática tramitam na Câmara dos Deputados e no Senado Federal. Na Câmara, 79 PLs que abordam o termo “inteligência artificial” estão em tramitação. No Senado, são 10.
Apesar de estar em discussão desde 2018 na Câmara, o tema ganhou maior notoriedade em 2023: 56% dos projetos de lei sobre o assunto foram apresentados no ano passado. No Senado, 40% das matérias sobre IA foram protocoladas em 2023.
A necessidade de regulamentar o uso da tecnologia é considerada urgente para os presidentes da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado Federal, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). No fim de 2023, ambos demonstraram preocupação com o impacto da inteligência artificial na produção de fake news nas eleições deste ano. Um dos exemplos debatidos é o compartilhamento do chamado deepfake, técnica que consiste na criação de conteúdos não reais, em áudio e imagens. O recurso pode, por exemplo, criar vídeos falsos com pessoas públicas falando coisas que não foram realmente ditas por elas.
No ano passado, Lira chegou a manifestar a intenção de aprovar um texto sobre o assunto, antes mesmo que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) crie regras sobre o tema por meio de resolução.
No entanto, há o reconhecimento por parte do presidente da Câmara de que o tema é delicado. Lira está preocupado com a possibilidade de enfrentar resistência de algumas bancadas no Congresso, tal como aconteceu com o chamado Projeto de Lei das Fake News em 2023.
O texto estabelece as regras para a atuação de plataformas digitais e sites de mensagens instantâneas na remoção de conteúdo falso das redes sociais. O projeto, relatado pelo deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), encontrou oposição por parte da bancada evangélica. Os parlamentares argumentam que o texto limita a “liberdade de expressão” nas redes sociais.
Senado busca criar marco regulatório
Atuando desde o mês de agosto, a Comissão Temporária Interna sobre Inteligência Artificial (CTIA) planejava inicialmente seu funcionamento por um período de 120 dias, porém, teve seu prazo ampliado até abril. Sob a liderança do senador Carlos Viana (Podemos-MG) e sob a relatoria do senador Eduardo Gomes (PL-TO), o grupo de trabalho tem como objetivo definir uma referência regulatória para a tecnologia.
“Sobre inteligência artificial, a pressa é absolutamente ineficiente e ineficaz”, explica Gomes, que ressalta a dificuldade em criar uma legislação “viva”, que acompanhe as mudanças, também no resto do mundo, em locais como a União Europeia e os Estados Unidos.
O senador acredita que alguns pontos importantes possam ser regulamentados antes das eleições municipais, como a identificação da origem dos conteúdos e a validação destes. “Uma espécie de marca-d’água, é algo que também é discutido. É uma identificação, para que você tenha um campo de debate mais seguro”, pontua.
Discussão atrasada
O coordenador-geral adjunto da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep), Bruno de Souza, ressaltou que a discussão sobre inteligência artificial no Congresso ocorre há alguns anos, mas admitiu que o debate pode ser tardio caso as eleições de 2024 sejam levadas em consideração.
De acordo com a Constituição, normas que alteram o processo eleitoral devem ser aprovadas em um prazo de um ano de antecedência ao pleito.
“Claro que podem existir argumentos de que regular a inteligência artificial não altera o processo eleitoral e, portanto, a norma poderia ser expedida a qualquer tempo. Contudo, ainda que essa seja uma interpretação possível, fato é que não haverá segurança jurídica para partidos e candidatos utilizarem essa tecnologia nas campanhas”, afirma Bruno.
O coordenador da Abradep pontuou que, ao legislar sobre o assunto, o Congresso Nacional deve se atentar à responsabilização das empresas que produzem tecnologias de inteligência artificial.
“Essas empresas, caso identifiquem que suas ferramentas estejam sendo utilizadas para finalidades que enfraqueçam o regime democrático, devem realizar procedimentos para correções que bloqueiem, ou ao menos dificultem, esse desvio de utilização”, afirmou. Ele também destacou a importância da transparência e do seguimento padrões éticos no uso da IA.
Audiência no TSE
Na última quinta-feira (4/1), o TSE divulgou a minuta de uma norma para atualizar a resolução sobre propaganda eleitoral. O texto pretende disciplinar o uso de inteligência artificial no pleito deste ano, como tentativa de barrar conteúdos falsos.
A minuta prevê que será necessário explicitar, de forma destacada, que o conteúdo foi “fabricado ou manipulado e qual tecnologia foi utilizada”. Também será proibido utilizar conteúdo manipulado pelas plataformas com informações “sabidamente inverídicas ou gravemente descontextualizadas”.
Conteúdos criados, parcial ou integralmente, “por meio do uso de tecnologias digitais para criar, substituir, omitir, mesclar, alterar a velocidade, ou sobrepor imagens ou sons, incluindo tecnologias de inteligência artificial, deve ser acompanhada de informação explícita e destacada de que o conteúdo foi fabricado ou manipulado e qual tecnologia foi utilizada”, explicita o texto.
As propostas ainda serão discutidas em audiências públicas entre os dias 23 e 25 de janeiro, e depois precisam ser aprovadas pelo plenário da Corte Eleitoral.
A proposta prevê pena de prisão de 2 meses a 1 ano para produção, oferta ou venda de vídeos falsos. A pena pode ser aumentada em casos específicos, como crimes cometidos através das redes sociais ou promoção da discriminação contra as mulheres.
Fonte: Terra Brasil.