Tem sido assim há muito tempo. Um clube rico e poderoso domina com punho de ferro os relvados onde é jogado o futebol na península italiana. Seu nome? Juventus FC, a terrível “vecchia signora”, de longe a esquadra mais vencedora da história do “calcio”. Dona de impressionantes 34 “scudettos” (praticamente um terço de todos os títulos disputados) a Juventus é o time com a maior torcida do país.
No seu “habitat”, essa dama astuta e insensível não costuma dar chance às suas rivais, esmagando cinicamente qualquer pretensão que eventualmente surja da parte alheia. A sua fome de vitórias é insaciável, e a sua cobiça não tem limites, muitas vezes fazendo com que a disputa do campeonato italiano seja uma mera formalidade. Nos últimos anos não é exagero dizer que, antes mesmo que se inicie o torneio nacional, já se saiba quem será o vencedor quando chegar o mês de maio.
No período em que dura o campeonato, esquadras das mais variadas latitudes sofrem nas mãos enrugadas e fortes dessa verdadeira megera. Em Milão, Internazionale e Milan, clubes endinheirados, que possuem um passado considerável de triunfos, não tem sido páreo para a Juventus. Desfilando com altivez pela capital da moda, a elegante madame de roupa preta e branca costuma voltar para casa incólume, muitas vezes expugnando o mítico estádio San Siro.
Os times da capital, Roma e Lazio, igualmente são presas fáceis, servindo como cordeiros indefesos no altar do sacrifício armado para satisfazer o apetite pantagruélico da velha senhora. É bom que se diga que, além do seu invejável saldo bancário, a Juve costuma contar com a boa vontade de certos juízes, sempre inclinados a dar uma mão amiga na hora de tomar decisões contra ou a favor da “namoradinha da Itália”.
A parte meridional da Bota é o território do Napoli, esquadra que conta com uma grande e fanática torcida, e que recentemente tem figurado como postulante ao título. Mas na hora da verdade quem dá as cartas acaba sendo mesmo o time da família Agnelli, do norte frio e rico, cujos simpatizantes não se furtam em zombar da condição menos confortável dos nativos napolitanos, a quem chamam, jocosamente, de “criadores de ovelhas”.
A empáfia juventina não perdoa nem mesmo o Torino, clube vizinho de porta, e que um dia foi um dos mais temíveis conjuntos europeus. Em 1949, um tenebroso acidente aéreo dizimou o grande time do Torino, e, a partir de então, a velha senhora costuma aplicar surras sistemáticas na sua pobre irmã.
Entretanto, ao partir para voos maiores, a Juventus padece de uma estranha patologia. Apesar de ter vencido por duas vezes a Liga dos Campeões da Europa, em 1985 e 96, quando deixa o seu quintal o clube “bianconero” de Turim sofre uma curiosa metamorfose. Na hora de medir forças contra outros clubes do continente, o caçador acaba virando a caça, levantando sérias dúvidas quanto ao real valor do milionário quadro peninsular. Nem mesmo a chegada do famigerado astro Cristiano Ronaldo foi capaz de impulsionar a velha senhora rumo ao tão sonhado galardão.
Ontem, na decisão por uma vaga à semifinal do torneio contra o Ajax, o atacante português chegou a abrir o placar no Juventus Stadium. Após cobrança de escanteio, Ronaldo apareceu como um raio na área adversária, mandando a bola para o fundo das redes com uma bela cabeçada. Nas tribunas, a torcida se encheu de esperança, tremulando suas bandeiras alvinegras dentro da noite piemontesa. Mas, após empatar através de Van de Beek, o time holandês virou o jogo com De Ligt, acabando definitivamente com o sonho nutrido pela avarenta anciã dos gramados.
Dessa vez, quem tirou o doce da boca da velha senhora foi um time de garotos, sem nenhuma estrela do quilate de Cristiano Ronaldo, Dybala ou Matuidi. Resta à Juventus agora contentar-se com o seu destino inescapável: a conquista do oitavo “scudetto” consecutivo, láurea que deve ser confirmada no próximo sábado, em jogo contra a Fiorentina.
A Liga dos Campeões, contudo, ficará para uma próxima oportunidade.