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Denominação de origem atesta identidade e referência de vinhos e espumantes

Foto: Divulgação/Crédito Naiára Martini
Foto: Divulgação/Crédito Naiára Martini

Vale dos Vinhedos foi a primeira região a obter essa distinção no Brasil

Um vinho não é apenas um vinho. Há histórias contidas nele. Vinhos com Indicação Geográfica (IG), então, têm mais que isso. Somam-se, também, identidade, referência e reconhecimento. Imagine abrir uma garrafa de Merlot ou Chardonnay com o selo da Denominação de Origem Vale dos Vinhedos. Esse selo garante que as uvas foram cultivadas exclusivamente na região, colhidas à mão, e que o vinho seguiu um padrão rigoroso que envolve desde a variedade plantada até o tempo mínimo de maturação. É como provar um retrato líquido do terroir local – algo que só poderia nascer aqui.

O lugar foi o primeiro do Brasil a ser reconhecido como IG, ainda em 2002. Indicação Geográfica é um registro concedido pelo Instituto Nacional da Propriedade Intelectual (INPI) que, portanto, reconhece e garante a origem, a qualidade e as características regionais de um determinado produto ou serviço. É uma forma de diferenciar produtos de regiões que, ao longo dos anos, ganharam fama e reputação pelo saber fazer, comunicando sua excelência. No Brasil, as indicações geográficas se dividem em Indicação de Procedência (IP), relacionada ao nome geográfico do lugar que se tornou conhecido por seus produtos ou serviços, e em Denominação de Origem, quando, além disso, designa, produtos ou serviços cujas qualidades ou características estão ligadas exclusiva ou essencialmente ao meio geográfico, incluídos fatores naturais e humanos.

Para ser reconhecida como I.G., o Vale dos Vinhedos percorreu um longo caminho. Primeiro de tudo foi preciso formar a Associação dos Produtores de Vinhos Finos do Vale dos Vinhedos (Aprovale), em 1995. Depois, foram anos de trabalho ao lado de órgãos de pesquisa e universidades, que originaram um dossiê técnico para embasar o pedido de reconhecimento de Indicação Geográfica, primeiro na modalidade Indicação de Procedência, até obter a distinção, em 2002. “Uma Indicação Geográfica não surge, ela já existe. O que ocorre é um reconhecimento a ela por reunir um notório conhecimento para produzir determinado produto dentro de uma condição que só lá existe”, diz o presidente da Aprovale, André Larentis.

Com isso, vinícolas que atendessem aos padrões estabelecidos no Caderno de Especificações Técnicas do Conselho Regulador da Indicação Geográfica Vale dos Vinhedos, atrelado à Aprovale, podiam exibir o selo de I.P. Mas a entidade queria uma classificação ainda mais restritiva a seus produtos, e deu início ao trabalho de obtenção da D.O. Na solicitação, é preciso apresentar a descrição das qualidades e das características do produto que se destaca, exclusiva ou essencialmente, por causa do meio geográfico e dos fatores naturais e humanos.

A conquista da D.O. foi concedida em 2012, sendo a primeira para vinhos e espumantes no Brasil, evidenciando um grande avanço na tradição da cultura vitivinícola do Vale, em voga desde meados de 1875, com a chegada dos primeiros imigrantes italianos. Com ela, o vinho e o espumante  passam a ter seu “nome”, com suas qualidades e características atribuídas à terra, ao clima, às pessoas, à história e à cultura da região. A conjunção desses fatores influencia no resultado final do produto, tornando-o único.

Hoje, 14 vinícolas estabelecidas no Vale dos Vinhedos exibem rótulos com D.O., uma conquista balizada por uma série de rigorosas particularidades e que referendam o compromisso com a excelência. O diretor do Conselho Regulador da IG Vale dos Vinhedos, Moisés Brandelli, ressalta que a D.O. confere um selo distintivo de qualidade e autenticidade. “Ela resguarda a tradição e a identidade da região, mas também fortalece a reputação internacional dos vinhos e espumantes locais. Ao assegurar padrões rigorosos, promovemos a singularidade dos terroirs do Vale, destacando a maestria dos produtores e consolidando nossa posição entre os grandes expoentes mundiais de vinhos e espumantes”, avalia Brandelli.

Especificações para a D.O.

Para conquistar o selo da Denominação de Origem Vale dos Vinhedos, a jornada começa já no vinhedo. As uvas devem ser 100% provenientes da área demarcada –  72,45 km² que abrangem partes de Bento Gonçalves, Garibaldi e Monte Belo do Sul – e a colheita, sempre manual. Só entram no processo vinhedos conduzidos em espaldeiras, com produção controlada: até 10 toneladas por hectare para vinhos e 12 para espumantes. As variedades emblemáticas são a Merlot, entre os tintos, e a Chardonnay, entre os brancos, reconhecidas como as que melhor expressam a identidade local.

Elas podem ser acompanhadas por Cabernet Sauvignon, Cabernet Franc, Tannat, Pinot Noir e Riesling Itálico. No caso dos varietais, ao menos 85% das uvas devem ser da variedade emblemática; para assemblages, o mínimo é de 60%. Já os espumantes – sempre pelo método Tradicional, com segunda fermentação na garrafa – precisam ter no mínimo 60% de Chardonnay ou Pinot Noir, podendo incluir Riesling Itálico. Além disso, os vinhos tintos maturam por pelo menos 12 meses, e se passam por barricas, elas devem ser exclusivamente de carvalho; os espumantes, por sua vez, permanecem ao menos nove meses em contato com as leveduras.

Após todas as comprovações documentais, acontece mais um processo: a coleta das amostras dos vinhos inscritos, realizada pelo consultor técnico da Aprovale. Apenas ele sabe de quais vinícolas são as garrafas, uma vez que eles são etiquetados unicamente com códigos. Elas passam por uma análise sensorial às cegas em que são avaliados aspectos organolépticos qualitativos e quantitativos por um grupo de enólogos formado por profissionais da Aprovale, da Embrapa e da Associação Brasileira de Enologia. Nessa análise, são verificados aspectos visuais, olfativos, gustativos e tipicidade varietal, além de os vinhos serem avaliados nos laboratórios de enoquímica, para verificação da adequação à legislação brasileira e ao regulamento de uso.

Em caso de aprovação, a vinícola possui 60 dias para solicitar a numeração de controle de cada garrafa de vinho branco. Os tintos demandam 12 meses de maturação mínima, e os espumantes passam pelo período de tomada de espuma. Passado este prazo, o vinho ou o espumante deve passar por nova avaliação qualitativa no momento em que a vinícola decidir comercializá-lo, quando também deverá solicitar a aprovação do rótulo. Todos os vinhos recebem um laudo com aspectos apontados em análise, portanto, em caso de reprovação, o enólogo pode corrigir os aspectos apontados e solicitar um recurso para nova avaliação. Os vinhos com D.O.V.V. possuem um selo indicativo e um número de controle, único para cada garrafa. Desde 2012, foram elaboradas mais de 5 milhões de unidades com origem e qualidade garantida pela D.O. Vale dos Vinhedos.

Mais do que um selo, a Denominação de Origem Vale dos Vinhedos é a tradução em vinho da alma dessa terra. Cada garrafa carrega a história das famílias, a dedicação dos produtores, a singularidade do clima e do solo, e um saber fazer transmitido por gerações. É esse conjunto que torna os vinhos e espumantes do Vale únicos – e que os coloca lado a lado com as mais prestigiadas regiões vitivinícolas do mundo.

Números da IG do Vale dos Vinhedos

Selos emitidos até 2022

Indicação de Procedência: 17.708.706 selos

Denominação de Origem: 5.648.397 selos

Número de amostras até 2024

Indicação de Procedência: 448 amostras

Denominação de Origem: 320 amostras

Litragem até 2024

Indicação de Procedência: 14.263.990 litros / 19.018.653 garrafas

Denominação de Origem: 4.652.650 litros / 6.203.530 garrafas – espumantes representam aproximadamente 30%